quarta-feira, 7 de abril de 2010

Fahreinheit 451, do vencedor do Nebula

É, o título é novamente proposital, mas eu realmente gostei dessa forma de escrever ele. Um vencedor do Nebula na biblioteca pessoal de fraulein Hedler! Ah sim, se é que vai aparecer um terceiro leitor desse texto, Nebula é um prêmio para o melhor escritor de ficção científica nos Estados Unidos. É tipo, wow, massa, legal! Não sou O leitor de ficção científica, mas tenho meus lidos. Alguns contos sobre robôs e "um livro e meio" da triologia Fundação, do broderzíssimo Asimov (que esteja nos céus, prometo que termino sua trilogia algum dia). Apesar de vencedor do Nebula (o autor, não livro), não encararia Fahrenheit 451 como um livro de ficção científica puro e simples. Ele é muito mais do que isso. Entra na seara de outro tipo de livro que gosto muito: Utopias e, principalmente, distopias!

É, novamente, outro tipo de livro que gosto muito, apesar de não ter aí uma leitura muito extensa. Li apenas o 1984 do (mais do que) camarada George Orwell (leitura da vez, inclusive, A Flor da Inglaterra ((porque "aspidistra" pra nome de flor é sacanagem mesmo))) e a mãe de todas, Utopia do mano Thomas More (tipo inglês de oferencendo mais bebida: "Acabow sew whisky? Thomas More!). Talvez tenha lido alguma coisinha mais, mas não me lembro agora. Mas o que me agrada em utopias e distopias? Foi o que já disse antes. Elas conseguem, por muitas vezes, assim como as ficções científicas, expressar de forma mais clara os anseios e aspirações de determinada geração. Dificilmente lerei algo mais fascinante do que sci-fi dos anos 50, no pós-guerra. É uma mistura de esperança por tempos melhores com o medo da onipotência das máquinas.

Fahrenheit 451 entra aí como uma distopia com poucos elementos de ficção científica. Tirando o sabujo e um ou outro "eletrodoméstico", R. Bradbury "viajou" muito pouco "na maionese". O mundo descrito por ele, fisicamente, digo, muito pouco difere daquele em que viveu enquanto escrevia o livro, no finalzinho dos anos 40.

O motor da distopia em Fahrenheit 451 é um mundo, digo, um Estados Unidos (egocentrismo ianque pós-segunda guerra é fogo...), em que os bombeiros, ao invés de apagar incêndios (sim, o mundo de Bradbury não pega fogo!), queima livros. Livros esse que, como explica o autor, ou melhor o professor Faber, deixaram de serem lidos por iniciativa da própria população. O governo embarca nessa onda, proibindo um número cada vez mais de livros que "ofenderiam as minorias", acabando fazendo que quase nenhum livro tenha sua leitura permitida.

Destaco aqui um artifício que também foi usado por George Orwell em 1984. Sua distopia é dual. Há dois "mundos". Um que vive numa caixa-forte, isolado do outro mundo, que, em geral, vive em miséria e, por vezes, com inveja e dominado pelo "mundo caixa-forte (des)ideal". Esse é um artifício que causou um dos poucos pontos de incômodo que tive com o livro. Embora num contexto de guerra dos EUA "ideal" com o resto do mundo "marginal", Bradbury não se preopuca, assim como Orwell, esse em menor medida, em descrever esse mundo marginal. E isso desemboca no fato de o protagonista, "subversivo" dos valores (ou da falta desses) do mundo ideal tentar contato com um mundo diferente, por vezes o mundo "marginal". Seguindo uma leitura que eu fiz em Sociologia Jurídica semestre passado (ou seria retrasado? essa passagem de semestres é meio confusa), acontece que é o colonizador que toma ares libertários. É o colonizador quem vai até o colonizado e vê como este é miserável, ou, ainda, admirando a "simplicidade" (miséria mesmo) na qual vive esse colonizado. Lembrei agora que tem um filme que se encaixa muito bem nisso também, o Blade Runner. A "iluminação" de que vive em uma distopia sempre vem de cima. Em geral, nesse tipo de livros, a ação libertária nunca vem de baixo.

Uffa, acho que me empolguei demais aí em cima. Outro ponto agora. Não creio na possibilidade dum mundo do modo descrito por Ray (not Charles) Bradbury. Um mundo sem livros, mas com a circulação de outras formas de mídias, não acabaria naquela bagaceira toda que ele descreve. Mas é aí que temos que prestar atenção na pegadinha da história. Fim da década de 40 é perto do auge do cinema é pertinho pertinho do advento da televisão, já descrita por Bradbury, inclusive em 3d, 4d, pelas paredes de Mildred. O advento de um novo tipo de meio de comunicação sempre vem com as suspeitas de fim de outro. A história nos tem mostrado que isso não é muito acertado; rádio e jornal continuam circulando por aí.

O que vejo no romance é uma supervalorização do livro como forma de se manter idéias e ideais "intactos". Enfim, não creio que apenas os livros tenham potencial de realizar essa tarefa, embora, decerto, seja o melhor meio para tal fim. Televisão e rádio podem sim serem portadores de "idéias e ideais".

Enfim, temos que ver a crítica de Bradbury por outro ângulo. Não é apenas o fim dos livros que leva a essa bagaceira toda. A crítica de Bradbury, no fundo mesmo, pelo menos pela minha interpretação, é à crescente massificação dos clássicos. Não coloco "massificação" aqui como o movimento de se tornar mais popular, ou de ter acesso a quem antes não tinha. Digo massificação como idéia de tornar "idéias e ideais" em massa. Massa descartável, ainda por cima. E a idéia de resumos cada vez mais resumidos de livros e de informações (ironia: eu recomendar esse livro via twitter). Inclusive, o trecho que eu mais gostei da edição que li foi o que o autor chama de Coda, que, após o posfácio, dá as idéias gerais na forma de crítica mesmo, sem todo o jogo de metáforas do romance.

Pra ficar com uma criticazinha. Montag não convence muito como protagonista não. É meio fraco e sem vida. Talvez seja a intenção do autor, retratando a fraqueza e palidez do homem daquela "distopia". Mas ainda assim, Faber e Clarice, mesmo em sua simplicidade e na covardia daquele, empolgam muito mais.

Em fim, não me prolongo muito mais. Apesar da historinha meio xoxa, a idéia por trás dessa distopia é fascinante. Algo que realmente me pôs pra pensar. E tem toda a satisfação de ler um Nebula com idéias como essa. Ficção científica sem ficção científica dá em distopia. Eu colocaria, em caminha contrário, Frakenstein, que é uma distopia sem distopia que acaba em ficção científica (the first of all! Dá-lhe Maria Xeli, Go go go Mary Shelly). Livro pequeno, leitura rápida (um dia), pensamentos fervilhantes. De 0 a 10? 9. É, tá quase lá...

Gilberto G.

Nenhum comentário:

Postar um comentário